Comunicado sobre o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto num processo de violência doméstica
A CIG, enquanto organismo da Administração Pública responsável pela implementação das políticas públicas em matéria de combate e prevenção da violência doméstica e de género, cidadania, não discriminação e igualdade entre mulheres e homens, cuja missão e atribuições legais são definidos no Decreto Regulamentar n.º 1/2012, de 6 de janeiro, não tem, do ponto de vista jurídico, competência para tomar qualquer iniciativa relativamente ao recente Acórdão do Tribunal da Relação do Porto num processo de violência doméstica, tendo em conta o estrito respeito pelos princípios da legalidade, da separação de poderes e da independência dos tribunais.
Não pode, designadamente, proceder à abertura de qualquer processo disciplinar, conforme foi expressamente solicitado nas 55 queixas de cidadãos/cidadãs recebidas por esta Comissão, matéria cuja apreciação cabe em exclusivo ao Conselho Superior de Magistratura, órgão para o qual as referidas queixas foram remetidas e que de resto já anunciou a abertura de um inquérito ao juiz em causa.
Contudo, a CIG não pode deixar de expressar a sua preocupação pelo teor do referido Acórdão, à luz dos princípios do respeito pela pessoa humana, da igualdade entre homens e mulheres e da não discriminação, dado que o conteúdo do mesmo pode contribuir para uma indesejável naturalização e desculpabilização da violência doméstica e de género, conforme já referido pela Senhora Secretária de Estado da Cidadania e Igualdade ao pronunciar-se publicamente sobre o assunto.
A CIG prosseguirá o trabalho que tem vindo a realizar no apoio à formação e sensibilização de magistrados e magistradas para as questões da violência doméstica e de género, nomeadamente através da cooperação com o Centro de Estudos Judiciários, considerando que as sentenças dos tribunais devem espelhar, em primeira linha, os princípios que constam quer da Constituição e Leis da República, aqui se incluindo, tipicamente, os princípios da igualdade de género e da laicidade do Estado, quer de outros instrumentos de direito internacional, destacando-se, desde já, a Convenção do Conselho da Europa para a Prevenção e o Combate à Violência contra as Mulheres e à Violência Doméstica (Convenção de Istambul).
Lisboa, 26 de outubro de 2017