Tribunal de Justiça da União Europeia obriga à correção de dados relativos à identidade de género
O Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE) emitiu um importante acórdão no caso Deldits (C-247/23), declarando que, nos termos do Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados (RGPD) da UE, as autoridades nacionais responsáveis pela manutenção de registos públicos (como os registos de asilo) devem corrigir os dados relativos à identidade de género quando estes são registados de forma incorreta.
As associações ILGA-Europa e TGEU prestaram apoio no processo do TJUE à Sociedade Háttér, que representou a pessoa requerente, juntamente com o Comité Húngaro de Helsínquia no processo nacional.
No acórdão, o Tribunal decidiu que o direito de retificação nos termos do artigo 16.º do RGPD, em conjugação com o princípio da exatidão dos dados nos termos do artigo 5.º, n.º 1, alínea d), do RGPD, exige que as autoridades retifiquem, sem demora injustificada, os dados pessoais relativos à identidade de género constantes de registos públicos quando esses dados são inexatos.
É importante notar que o Tribunal decidiu que, se o objetivo da recolha de dados pessoais é identificar o indivíduo (como era o caso), os dados devem referir-se à identidade de género vivida pela pessoa e não ao sexo registado à nascença. A este respeito, o Tribunal sublinhou que um Estado-Membro não pode invocar a ausência de um procedimento nacional de reconhecimento legal da identidade de género para limitar o exercício do direito de retificação ao abrigo do RGPD.
Além disso, o Tribunal esclareceu que uma pessoa pode ter de apresentar provas relevantes e suficientes que possam ser razoavelmente exigidas para corrigir dados inexatos, mas os Estados-Membros não podem exigir provas de “cirurgia de reatribuição de sexo” “em nenhuma circunstância”. O Tribunal declarou que tal exigência é contrária ao direito à integridade pessoal (artigo 3.º) e ao direito à privacidade (artigo 7.º) da Carta dos Direitos Fundamentais.
Este acórdão terá efeitos de grande alcance, uma vez que estabelece claramente a obrigação de todas as autoridades nacionais que mantêm registos, bem como os serviços públicos, as organizações e as empresas vinculadas pelo RGPD, garantirem que os seus processos permitem a retificação dos dados pessoais que detêm, incluindo os dados relativos à identidade de género das pessoas.