Nota de pesar pelo falecimento de Maria Teresa Horta
Maria Teresa de Mascarenhas Horta Barros (1937-2025) faleceu hoje, dia 4 de fevereiro.
Escritora, poetisa, jornalista e ativista, é conhecida como uma das mais destacadas feministas portuguesas, tendo feito parte do Movimento de Libertação das Mulheres de Portugal.
Em dezembro de 2024, foi incluída numa lista de 100 mulheres mais influentes e inspiradoras de todo o mundo, elaborada pela estação pública britânica BBC, que inclui artistas, ativistas, advogadas ou cientistas.
Com Maria Velho da Costa e Maria Isabel Barreno (as Três Marias), foi uma das autoras de “As Novas Cartas Portuguesas”, marco inquestionável na história da literatura portuguesa. Ana Luisa Amaral descreve a obra como “um libelo contra a ideologia vigente no período pré-25 de Abril (denunciando a guerra colonial, o sistema judicial, a emigração, a violência, a situação das mulheres), revestindo-se de uma invulgar originalidade e atualidade, do ponto de vista literário e social. Comprova-o o facto de poder ser hoje lido à luz das mais recentes teorias feministas (ou emergentes dos Estudos Feministas, como a teoria queer), uma vez que resiste à catalogação ao desmantelar as fronteiras entre os géneros narrativo, poético e epistolar, empurrando os limites até pontos de fusão.”
O livro, publicado em 1972, foi banido e censurado pelo regime do Estado Novo por alegada ofensa à moral pública, fez manchetes e inspirou protestos em todo o mundo. O impacto internacional da obra deu-se logo pouco depois da sua divulgação em França pela escritora feminista Simone de Beauvoir, e pelo conhecimento público do processo de que as “Três Marias” estavam a ser alvo, com a cobertura do julgamento feita por meios de comunicação internacionais (entre os quais Le Monde, Time, The New York Times, Nouvel Observateur e televisões norte-americanas). Nesta sequência, realizaram-se manifestações feministas em várias embaixadas de Portugal no estrangeiro, assim como a defesa pública da obra e das autoras por várias personalidades internacionais, como Marguerite Duras, Doris Lessing, Iris Murdoch e Delphine Seyrig.
Em outubro de 2022, o Estado Português e a CIG, aquando da realização do Fórum Igualdade – Encontro Feminista no âmbito da Temporada Cruzada Portugal França, prestaram homenagem à obra e à sua única autora viva, Maria Teresa Horta.
Mantém-se ativo o grupo de estudos do impacto da publicação das novas Cartas, fundado por Ana Luisa Amaral e Marinela Freitas e que conta com equipas em Portugal, Alemanha, Estados Unidos da América, França, Itália, Inglaterra, Irlanda, Suécia e Países Africanos de Língua Portuguesa, o que demonstra a intemporalidade e abrangência da importância da escrita destas 3 mulheres.
Em 2024, Maria Teresa Horta foi uma das biografadas para o projeto da CIG Mulheres pela Igualdade, uma forma de contar a história inspiradora de mulheres que, com fervor e determinação, se dedicaram à defesa das conquistas do 25 de Abril, moldando de maneira profunda a sociedade portuguesa.
Na sua biografia “A Desobediente”, a autora Patrícia Reis descreve-a como a “insubmissa, que se envolve por acaso com o PCP e mantém intensa atividade política no pré e no pós-25 de Abril; a poetisa, a mãe, a mulher que constrói um amor desmedido por Luís de Barros; a grande escritora a quem os prémios e condecorações chegaram já tarde (ainda que, em alguns casos, a tempo de serem recusados).”
Em março de 2024, Miguel Esteves Cardoso homenageia a escritora e diz que aprendeu “com ela a palavra lonjura. Foi com ela que aprendi a saudade ligada ao desejo, ao corpo e à imaginação, à vontade de ser amado.” O autor descreve ainda a poesia de Maria Teresa Horta como “uma habitação erótica e afirmativa, aventureira e misteriosa, onde qualquer adolescente se podia refugiar, e sentir em casa, e partir dali para o seu próprio caminho.”
Estreou-se na poesia em 1960, com Espelho Inicial; no ano seguinte participou com Tatuagem em Poesia 61, e tem a sua obra poética editada em Portugal (17 títulos, entre os quais o inovador Minha Senhora de Mim, recentemente reeditado) coligida em Poesia Reunida (2009). Posteriormente, trouxe a público Poemas para Leonor (2012), A Dama e o Unicórnio (2013), Anunciações (2016) – Prémio Autores SPA / Melhor Livro de Poesia 2017 –, Poesis (2017), Estranhezas (2018), vencedor prémio Literário Casino da Póvoa/Correntes d’Escritas 2021, e a antologia pessoal Eu Sou a Minha Poesia (2019).
Na ficção, foi autora de Ambas as Mãos sobre o Corpo (1970), Ana (1974), Ema (1984), Cristina (1985) e A Paixão segundo Constança H. (1994), e coautora, com Maria Isabel Barreno e Maria Velho da Costa, das internacionalmente reconhecidas Novas Cartas Portuguesas (1972).
Em 2011, publicou As Luzes de Leonor, romance sobre a Marquesa de Alorna distinguido com o Prémio D. Diniz, da Fundação da Casa de Mateus. Em 2014, ano em que lhe foi atribuído o Prémio Consagração de Carreira pela Sociedade Portuguesa de Autores, editou o volume de contos Meninas. Com livros editados no Brasil, em França e Itália, Maria Teresa Horta foi a primeira mulher a exercer funções dirigentes no cineclubismo em Portugal e é considerada uma das mais destacadas feministas da lusofonia.
Publicou diversos textos em jornais e foi também chefe de redação da revista Mulheres, que tinha um forte cunho feminista e essencialista, a convite do Partido Comunista Português, do qual foi militante durante catorze anos entre 1975 e 1989.
Em 2004, foi agraciada com o grau de Grande-Oficial da Ordem do Infante D. Henrique e em 2022, foi agraciada com o grau de Grande-Oficial da Ordem da Liberdade.
A Maria Teresa Horta partiu, mas o seu trabalho e a sua influência na construção da igualdade ficam connosco para sempre!