Opinião
“A discriminação não é natural nem aceitável e a igualdade é um imperativo urgente.”
Regina Tavares da Silva
Ex-Presidente da CIG e especialista nacional e internacional em Igualdade de Género
Definidos os princípios há que torná-los realidade
Criada em 1975 em regime de instalação, a Comissão da Condição Feminina (CCF) ¬- depois Comissão para a Igualdade e para os Direitos das Mulheres (CIDM), hoje Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género (CIG) – foi institucionalizada em 1977 com objetivos claros:
- contribuir para a transformação da maneira de ser e de pensar dos homens e das mulheres, de modo a que toda a pessoa humana – homem ou mulher – goze de plena dignidade;
- alcançar a coresponsabilidade efetiva das mulheres e dos homens em todos os níveis da vida social portuguesa;
- trabalhar para que toda a sociedade encare a maternidade como função social e assuma as responsabilidades que daí decorrem.
Sendo tais objetivos hoje princípios adquiridos, a sua formulação e a criação da própria instituição para os prosseguir constituem aspetos inovadores e portadores de esperança num momento em que a sociedade portuguesa vivia uma fase de mudança e renovação; momento que, no que se refere à situação das mulheres, era, aliás, convergente com um movimento de mudança a nível global, simbolizado no Ano Internacional da Mulher e na Década das Nações Unidas para as Mulheres que o seguiu.
Assumia-se que as questões relativas à situação das mulheres, à eliminação da discriminação e à construção da igualdade, são questões políticas, da responsabilidade do Estado e da sociedade. E, por outro lado, questões não apenas jurídicas, de reconhecimento de direitos, mas questões de carácter estrutural e social que implicam uma mudança substantiva em todas as esferas da vida.
Um pensamento inovador para a época, presente na criação da CCF, e que se traduziu designadamente em duas perspetivas hoje reconhecidas como fundamentais. A primeira, o carácter intersectorial da ação a prosseguir, através da Secção Interministerial do Conselho Consultivo; a segunda, a cooperação com a sociedade civil, legitimada através da Secção de ONG do mesmo Conselho.
Em todo este processo, uma voz pioneira deve ser lembrada – a de Maria de Lourdes Pintasilgo – que esteve no seu início, conduziu os primeiros passos e inspirou uma visão de futuro na base de plena e igual dignidade para mulheres e homens.
Passadas quatro décadas é tempo de reflexão sobre o caminho percorrido e o caminho ainda a percorrer. Para alguns/algumas, mudadas as leis, lançados os programas, pouco mais há a fazer… Resta esperar, dar tempo ao tempo, aguardar a evolução natural…
Não é essa a nossa visão. A discriminação não é natural nem aceitável e a igualdade é um imperativo urgente. Definidos os princípios há que torná-los realidade. E isto deve ser feito “sem demora”, como bem expresso no artigo 2º da Convenção sobre a Eliminação de todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres.
O caminho está claramente indicado e as duas Declarações Políticas sobre Igualdade do Conselho da Europa, a primeira em 1988, e a segunda duas décadas mais tarde, em 2009, apontam-no. Enquanto a primeira proclama os princípios, isto é, “a igualdade das mulheres e dos homens é um princípio que decorre dos direitos da pessoa humana… e uma condição essencial da democracia…”, a segunda concentra-se no essencial do momento presente, expresso no título que proclama que o que importa agora é “tornar a Igualdade de Género uma realidade”.